15 DE AGOSTO DE 1896 - RIO DE JANEIRO: UMA EXCELENTE CORRIDA NA PRAÇA DE TOUROS CARIOCA (na imprensa brasileira)


Biblioteca nacional do Brasil


A tourada de hontem

Ás vezes n'uma praça de touros o publico é victima de uma burla inesperada. A companhia tauromachica mostra os melhores desejos de bem servir, mas o gado furta-se a toda a sorte, e não ha meio de se ter uma tourada em regra. Hontem foi o inverso, tourada magnifica e o amphytheatro com immensos espaços vasios.

Concorreram de certo para isso a festa da Gloria, que nunca deixa de ser um grande attractivo, e a circumstancia de se manter aberta a maioria dos estabelecimentos commerciaes da nossa praça. Foram logrados, portanto, os que lá não foram.


Hoje, naturalmente, dia desoccupado, outra será a concurrencia.

Ás 3 1/2 horas da tarde, o intelligente da praça mandou dar o signal para apresentação dos toureiros, entrando na arena a cuadrilha e os dois cavalleiros José Bento de Araujo e Alfredo Tinoco da Silva em soberbos corceis, ricamente ajaezados.

Feitas as solemnes continencias enthusiasticamente correspondidas pelo publico, Tinoco apresentou-se noutro cavallo e disposto a farpear o 1º touro que logo saiu.

Era um bom animal preto, ligeiro, dos que a companhia trouxe de Portugal, escolhido entre os do creador Paulino da Cunha e Silva. Fez boa figura de bravo, e proporcionou a Tinoco sortes felicissimas. Uma pega de cara terminou a lide a que o bicho se sujeitou e o publico ficou satisfeito.

O 2º touro veiu zangado; mas a sua colera não era provocada pela presença de Carlos Gonçalves e Luiz Homem. Elle tinha outros motivos que não revelou; e, justiceiro, não quiz exercer vinganças em quem não era culpado. D'ahi a falta de sortes. Quando lhe pegaram á unha, não resistiu, submetteu-se e até deitou-se inoffensivo.

O 3º do creador Palha Blanco, de Portugal, foi lidado pelo espada Colon, que mostrou ainda uma vez a sua destreza e habilidade para citar a féra e fazer-lhe surpresas.

No intervalo que se seguiu foi largamente vendido um pequeno "orgão da arte tauromachica" Sol e Sombra, folha bem redigida e bem impressa de que já haviamos recebido um exemplar. Traz o retrato de José Bento (de Araújo) e algumas coisas de espirito.

Biblioteca nacional de España

O 4º touro, nacional, foi bandarilhado por Gonçalves da Silva, e deu que fazer. Cabela alta e irrequieta, armação enorme, dofficultava todo o trabalho, e provocou gargalhadas infinitas, até na pe´ga, em que os moços de forcado andaram aos trambulhões.

o 5º, do Laranjal, tambem foi habilmente lidado por Luiz Homem e Manoel Brabo.


O 6º foi o grande touro do dia. Apresentou-se para farpeal-o o perfeitissimo cavalleiro José Bento (de Araújo), e o seu porte e a sua destreza arrancaram applausos justos de toda a assistencia. O touro arremettia sempre; e o cavallo sempre sahia na tangente depois que uma farpa se firmava no cachaço do animal indomavel.

Durante essa corrida, levantaram-se os animos, e José bento (de Araújo), com seus feitos de perfeição, galhardia, perigo e firmeza de sella, foi alvo da mais estrepitosa ovação.

O publico saiu satisfeito, e reputou a corrida de hontem melhor do que as duas primeiras. A de hoje melhor será ainda, pois ha um animal para ser lidado por Tinoco e José Bento (de Araújo), juntos.

In O PAIZ, Rio de Janeiro - 16 de Agosto de 1896