NOVEMBRO DE 1893 - LISBOA: OS CAVALEIROS FERNANDO DE OLIVEIRA, ALFREDO TINOCO E JOSÉ BENTO DE ARAÚJO JUNTOS NO CAMPO PEQUENO, (na imprensa francesa)

 


Lisbonne. — Dimanche, 15 octobre. — Course au profit de l'asile des enfants abandonnés. Les toros de D. Caetano de Bragance, furent très braves dans leur majeure partie. 

Les amateurs Mario Duarte et Pedro Figueiredo, très applaudis.

Les pegadores ont été vaillants.

— Prochainement, grande course avec le concours des cavaliers en place JOSÉ BENTO DE ARAUJO, TINOCO et FERNANDO.

Le matador TORERITO prendra part à la corrida. Le bétail est du vicomte de Varzea.

In LE TORERO, PARIS - 5 de Novembro de 1893

AS RECORDAÇÕES E OS CONCEITOS DE MANUEL DOS SANTOS (O CAVALEIRO JOSÉ BENTO DE ARAÚJO CITADO A PROPÓSITO DO BRASIL)

 


"FADOS, MULHERES E TOIROS"
Pepe Luiz, Lisboa - 1945


Manuel dos Santos

O toireiro-poeta da velha guarda


Manuel dos Santos num momento de meditação invocando as musas para as suas composições poéticas.

Manuel dos Santos completou, no passado dia 15 de maio, a bonita idade de setenta e três anos. Nesse dia houve festa na sua casa e na roda dos seus amigos. Não foi uma festa de espavento. Manuel, quando tem à sua frente uma media dúzia de pessoas amigas, é festa certa e animada, porque êle se encarrega de alegrar todos com os seus chistes e para tudo tem um comentário bem humorado.

A narrativa de casos pitorescos e a piada a tempo, são a sua especialidade. E agora o leitor pode fazer uma idéia do que se passa em determinado quarto andar da rua Álvaro Coutinho, no dia do aniversário de Manuel dos Santos, na ocasião em que a sua numerosa e simpática família ali o vai abraçar pelo facto de êle ter alcançado mais uma primavera… êle nunca deixou de possuir uma alma jovem!

Até o seu papagaio entra nas manifestações festivas:

Adeus ó Manel! Eh! Eh! Eh!.... ó Manel toca p’ra unha! Tatarari… tatarari!...

Assim palra o animalzinho.

Manuel dos Santos tem atrás de si uma vasta história de activo trabalhador.

Aos sete anos entrava em pantominas no velhíssimo Circo Price; brincava com a sua vizinha, hoje a gloriosa actriz Adelina Abranches; e aos dez começou a aprendizagem numa oficina metalúrgica. Aos domingos tomava parte, como andarilho, nas corridas da praça de toiros do Campo de Santana.

Às noites começou a representar nos teatros, desempenhando, com agrado, alguns papéis nas revistas de grande fama: «Micróbio», «Pontos nos ii», «Seis meses na Parvónia», etc.

Ao atingir 16 anos, assentou praça na Marinha de Guerra; viajou muito e adquiriu grandes simpatias, pelo seu feitio divertido, e a tal ponto que entre a guarnição era conhecido pelo «Vida alegre».

Sempre cumpridor do seu dever, e após bastantes anos de Armada, Manuel transitou para a vida civil, dedicando-se ao toireio, e em breve conquistou enorme popularidade pela sua valentia, temperada por uma vigorosa intuïção artística, intuïção que o levava a executar variadíssimas sortes que êle observara a grandes «diestros».

Em 1905, o célebre matador Antonio Fuentes convidou-o a sair na sua quadrilha numa das corridas da feira de Sevilha. Toireavam também Quinito e Bombita. Manuel bandarilhou com tanto êxito um toiro de Ibarra, que Fuentes enviou-lhe a cabeça embalsamada do bravo animal, com esta honrosa decicatória gravada numa placa de prata: «Al valiente banderillero lusitano Manuel de los Santos le ofrece este recuerdo de su début en Sevilla, su gran amigo Antonio Fuentes».

Pois êste objecto, que significa um acto de extrema gentileza do inesquecível Fuentes, decora ainda uma das paredes principais da sala de jantar da residência de Manuel dos Santos.

Tôda a família Santos é aficionada, em especial os filhos, Vítor, que foi amqador tauromáquico e não fêz má figura, e José, que numa boa parte do ano vive sôbre as águas do mar.

Uma das facêtas interessantes do espírito de Manuel dos Santos está espelhada no feitio lírico com que, por vezes, se expressa, como se tivesse bebido a água cristalina da fonte de Hipocrene.

Escreveu para o teatro e ainda hoje nunca foge às rimas, como verifiquei, quando respondeu às perguntas que lhe enderecei durante a visita que lhe fiz numa tarde recente.

Nas dependências da sua residência, vêem-se recordações por todos os lados: fotografias, quadros, uma vitrine com brindes oferecidos nas suas festas artísticas. Em determinada altura do diálogo, rompeu esta quadra:

«Ali, no quarto onde moro,

Modestamente emoldurados,

Estão por mim colocados

Os santos que mais adoro».

Já se deixa ver que de tôda aquela densa espiritualidade que palpita através das inúmeras recordações espalhadas pelas paredes, compartilha a figura simpática e altiva dum devotadíssimo amigo: Fernando de Oliveira!

 

Como velho toireiro — porque foi um profissional com paixão — nunca esquece o pundonor que deve honrar o que veste o trajo de bordados e taleguilla, e a propósito interroguei:

— O que diz das corridas em que há toiros sem toireiros?

—        «Sinto minh’alma cair

            No fundo do meu passado,

            Se vejo um toiro investir

            E ser mal aproveitado.»

E acêrca da vida do toireiro, disse estas redondilhas:

«Não há nenhum que se gabe,

De não cair quando corre,

Nem adivinha, nem sabe,

Se quando toireia morre.»

 

«No decorrer da toirada,

A quem sabe, custa ouvir,

Ao que é bom, assobiar,

E quanto ao mau, aplaudir.»

Como não lhe passasse desapercebido o nosso reparo duma cicatriz que possue numa das faces, lofo elucidou:

«A cicatriz do toireiro

Nem sempre é sinal de falha,

Quem se arrima é verdadeiro,

Traz sôbre a pele a medalha.»

 

«A vergonha nuca dói

O efeito da marrada,

Ao que quere ser um herói

Dói-lhe mais a pateada.»

A conversa, derivando para a comparação entre a bola e os toiros, provocou as seguintes considerações rimadas:

«Mais ligeiros que audazes,

Jogam vinte e dois rapazes,

Mas nenhum encontra a morte.

Nos toiros damos aos «butes»,

Duas bolas, quatro «chutes»,

Em verdadeiro recorte.»

 

«Na luta greco-romana,

Os truques são combinados,

De tal modo disfarçados,

Iludem dar forma e gana,

No foot-ball há pavana,

E bairrismo apaixonante,

A gritaria é sonante.

Nos toiros há bulha aguda,

Não brilha a toirada muda

Dentro dum toiro excitante.»

Como todos sabem, Manuel dos Santos foi o peão de brega de grande confiança e dedicado amigo dêsses espírito de eleição que se chamou Fernando de Oliveira, o único toireiro que até à data perdeu a vida no redondel do Campo Pequeno. Para êle Manuel teve esta quadra quando se comemorou o infausto acontecimento:

«De modos nobres, serenos,

Faz trinta anos que morreu.

Quem morre assim, deixa pena,

Quem assim morre, viveu.»

O grande cavaleiro Fernando de Oliveira, quando faleceu, estava disfrutando duma aura imensa, justificada pela galhardia do seu toireio, e, por isso, foi cantado pela lira popular em glosas sentimentais a que o fado deu singular expressão.

Falando-se do fado, o velho bandarilheiro soltou mais êste indicativo da sua inspiração poética:

 

«Creiam que me capacito

Que o fado tem movimento,

Com salada e peixe frito,

Lá nas hortas a contento.

 

Não foi uma desgraçada,

Teve um amor verdadeiro,

A Severa foi amada

Por um fidalgo toireiro.

 

Maria de Lourdes tem

Carinhos de enfermeira,

Sendo assim, ela contém

Bom fundo p’ra cantandeira.

 

A guitarra é batuta,

Num compasso harmonioso

Comigo ninguém discuta,

Ganha a palma o rigoroso.

 

Amália Rodrigues é

A estrêla do lindo fado,

Cheia de carinho e fé,

Faz recordar o passado.

 

É Maria Raquel

Autêntica portuguesa,

Anima o redondel,

É do fado a princesa.»

Em determinada corrida de toiros dirigida por Manuel dos Santos, de vez em quando ouvia-se a voz dum espectador:

Ó Manuel, toca!... Ó Manuel, toca!... toca!...

E Manuel abanava a cabeça num gesto negativo.

— Não toca, porquê? — perguntou, furioso, o espectador.

— Porque não sei!

E na conversa que tive com Manuel, revelou também o seguinte comentário:

«Toca p’ra dentro, ó Manel,

A unha, toca p’rá unha!

Mandar tocar quem não sabe,

É coisa que não propunha.»

Manuel foi quatro vezes ao Brasil e disso jamais se esqueceu:

«Com Zé Bento (de Araújo) arrojado,

No Brasil andei lutando,

Com Macedo e Morgado,

E também com o Fernando.»

O que aqui fica nestas páginas não é mais do que o extracto duma tarde de paleio com Manuel dos Santos, cuja biografia está traçada em quatro sonetos da sua autoria e que êle guarda ternamente, como peça testamentária que os vindoiros hão-de apreciar.

Da sua casa saí, satisfeitíssimo. O bocado ali passado foi dos melhores.

O que não há maneira de olividar é o papagaio que repete os toques da corrida seja ela à portuguesa ou à espanhola.

Dá vivas ao Benfica para arreliar o Vítor Santos — filho de Manuel — que é sportinguista, e quando o dono da casa atravessa o corredor, de bengalinha, chapéu ao lado, fumando um charuto da «Companhia», lá se ouve o loiro de penas cinzentas:

Adeus ó Manel, até logo!...

Pode o velho toireiro gabar-se de que possue um papagaio «inteligente»!...

In FADO, MULHERES E TOIROS, Pepe Luis, Livraria Popular de Francisco Franco, Lisboa - 1945

29 DE NOVEMBRO DE 1899 - RIO DE JANEIRO: O CAVALEIRO JOSÉ BENTO DE ARAÚJO EMBARCA COM DESTINO A LISBOA (na imprensa brasileira)





Em viagem

Parte hoje para Lisboa o estimavel cavalleiro tauromachico José Bento de Araujo.

Que volte breve, com bons touros e bons companheiros de lide, são os desejos de todos os seus admiradores e amigos.

In GAZETA DE NOTICIAS, Rio de Janeiro - 29 de Novembro de 1899 

29 DE MAIO DE 1898 - RIO DE JANEIRO: MAIS UMA CORRIDA DE TOUROS NA CAPITAL DO BRASIL COM ARTISTAS EUROPEUS (na imprensa brasileira)

 


Biblioteca nacional do Brasil

SPORT

PRAÇA DE TOUROS

Domingo haverá grande tourada, na praça da rua das Larangeiras, devendo estrear os notaveis matadores Ezquiel Rodrigues, de Madrid, e Graciano Bernal, de Sevilha.

A todos quantos amam este genero de diversão não podiamos dar melhor noticia.


In A GAZETA DE NOTICIAS, Rio de Janeiro - 27 de Maio de 1898

LISBOA ORGULHA-SE DE POSSUIR UMA DAS MAIS FORMOSAS E ELEGANTES PRAÇAS DE TOIROS DO UNIVERSO (O CAVALEIRO JOSÉ BENTO DE ARAÚJO É REFERIDO)

 


"FADOS, MULHERES E TOIROS"
Pepe Luiz, Lisboa - 1945

É sempre curioso revolver a poeira do passado, recordando figuras e factos ligados à história da tauromaquia.

A praça de toiros da capital portuguesa, denominada «Campo Pequeno», por cujo redondel têm passado dos melhores artistas portugueses, espanhóis e mexicanos, é daquelas que possuem uma interessante história, que vou tentar desfiar.

Por volta de 1831, foi inaugurada a famosa praça do Campo de Santana, construída no local onde hoje existe a Escola Médica, a pedido do Administrador da Casa Pia de Lisboa e por conta desta instituição foram feitas as respectivas obras.

À primeira corrida assistiram D. Miguel de Bragança e sua irmã, a infanta D. Maria da Assunção, sendo, nessa tarde, mortos a rojão, pelos cavaleiros quatro toiros. Houve dois «espadas» espanhóis, quatro bandarilheiros portugueses, dez forcados e quatro intervaleiros pretos. Nas quadrilhas dos «espadas» vinha um toireiro português que tinha sido aluno da Casa Pia. Pela arena da referida praça passaram grandes sumidades do toireio, sendo durante muitos anos mantida a praxe de se largar um toiro para os homens da música, e, mais tarde, para os curiosos, em substituição daqueles. Também, no final do espectáculo, se repetiam as cortesias.

Não é bem êste o assunto de que pretendo ocupar-me, mas sim o do Campo Pequeno, cuja praça foi erguida após a demolição da velhinha do Campo de Santana, que se deu em 1889.


A praça do Campo de Sant'Anna em 1882.

Durante três anos, não houve espectáculos taurinos na capital, o que originou grande movimento na terras dos arredores que possuíam praças de toiros, como: Sintra, Moita do Ribatejo, Aldegalega, Setúbal, Barreiro, Almada, Vila Franca e Cruz Quebrada.

A ardente afeição à festa brava, de José Joaquim Peixinho, Joaquim Pedro Monteiro, Ressano Garcia, Pinto da Silva, Anastácio Gomes, Garcia Puga e do arquitecto Dias da Silva, proporcionou o levantamento do moderno tauródromo lisboeta no local onde, em 1740, existira uma praça destinada a divertimentos taurinos, e em que tiveram lugar sumptuosas corridas em obséquio de casas religiosas.

Foi em 1892 que se procedeu à inauguração da actual praça do Campo Pequeno, formosa e elegante, com o exterior em tejolo rosado, de linhas árabes, e o seu interior algo semelhante ao da sua congénere da Carretera de Aragon, de Madrid, apeada há alguns anos.

Do alto dos seus torreões se mira um panorama surpreendente, e em redor está reflorindo o vasto e bem talhado jardim Marquês de Marialva.

A fachada principal da praça de toiros do Campo Pequeno que, majestosa e rosada, se ergue ao centro do jardim Marquês de Marialva.

Teve foros de acontecimento citadino a corrida de aberura da praça, e, desde então, passou a reünir-se ali a fina flor da «afición», que acudia, em massa, e de pontos distantes do País. Na referida corrida toirearam os cavaleiros Alfredo Tinoco o artista de formidáveis qualidades que, numa tarde chegou a toirear a cavalo, bandarilhar e pegar como valente moço de forcado — e Fernando de Oliveira, o benjamim da tauromaquia nacional, que na tarde de 12 de Maio de 1904, no redondel que inaugurara, perdeu a vida, por motivo de uma colhida traiçoeira, infligida pelo toiro Ferrador, da ganadaria do Marquês de Castelo Melhor.

Na segunda toirada, a emprêsa apresentou o «espada» Valentim Martin; na terceira, Luiz Mazzantini; na quarta, «Cara-Ancha»; na quinta e na sexta (em dias seguidos), «Guerrita»; na sétima, «Espartero»; na oitava, Angel Pastor; na nona, «Torerito»; na décima, Antonio Reverte, com os célebres bandarilheiros Rodas e Moyano. Em 9 de Novembro, do dito ano de 1892, toirearam, a cavalo, D. António São Martinho, ainda vivo, felizmente, e o Visconde da Várzea; em 20 seguinte, José Palha Blanco enviou dez soberbos toiros para os cavaleiros Fernanddo de Oliveira e Manuel Casimiro, e para o matador Luiz Mazzantini; e, em 18 de Dezembro, às duas horas da tarde, começou a última corrida da época inaugural, em que foram lidados toiros de Emílio Infante (pai), por A. Tinoco e M. Casimiro e por Rafael Molina «Lagartijo», que fôra um colosso da tauromaquia.

No ano de 1893 realizaram-se no Campo Pequeno, trinta e seis toiradas, tendo sido corridos cêrca de quatrocentos e trinta toiros, e, até à data, vários empresários têm ali empregado a sua actividade, tais como: Dias, Monteiro, Gama, Lacerda, A.L. Lopes, Mário Infante, Albino J. Baptista, Batalha, Costa «Girafa», Carvalho, António Infante, Artur Teles, Carlos Iglésias Viana, José Segurado, D. Bernardo Mesquitela e a actual emprêsa que tem por gerente o antigo toireiro Muñoz Crespo.

Grandes corridas, e de inesquecível sumptuosidade, ali têm sido admiradas, e, entre elas, destacam-se: a da comemoração do Centenário do Descobrimento do Caminho Marítimo para a Índia; as de homenagem aos reis Eduardo VII, de Inglaterra, e D. Afonso XIII, de Espanha; a do benefício da Assistência Nacional aos Tuberculosos e tôdas em que intervinha o Clube Tauromáquico Português. Também se distinguiram, pela sua caprichosa organização, as das festas artísticas de Peixinho, Fernando de Oliveira, Manuel Casimiro, Cadete, Tôrres Branco, Manuel dos Santos, Teodoro, José Bento (de Araújo), Tomaz da Rocha, Morgado Covas, Alfredo dos Santos, etc.

CAMPO PEQUENO: Corrida de homenagem ao jovem rei de Espanha, Afonso XIII. O cavaleiro José Bento de Araújo é o primeiro à esquerda na foto.
Arquivo da CML

Memorável foi também a actuação, no redondel da capital, dos afamados «diestros»: Faíco, Emílio e Ricardo Bombita, Fuentes, Quinito, Rafael El Gallo, o célebre Joselito, Limeño, Juan Belmonte, o relembrado, genial e popularíssimo Rodolfo Gaona, Isidro Flores, Sanchez Mejias, Armillita e outros de assinalada categoria artística, quer no que respeita a matadores e novilheiros, quer a cavaleiros e bandarilheiros, profissionais ou amadores.

Quanto a criadores que se destacaram no fornecimento de gado bravo, anotamos: Dr. Máximo Falcão, Palha Blanco, Duarte, do Cartaxo, Gama, Casa Bragança, Paulino, Estêvão de Oliveira, Patrício, Robertos, Infante da Câmara, João Coimbra, António Luiz Lopes (pai), Pinto Barreiros, Esquivel, etc.

Nos primeiros anos, o gado entrava a pé, e por muito tempo se utilizaram os bandos que nas vésperas das corridas percorriam as ruas da Baixa e as dos bairros populares, em luzido e animado cortejo anunciador.


Praça do Campo Pequeno.
Arquivo da CML

Sempre que procedo a alguma visita ao excelente edifício, ao seu museu tauromáquico, aos currais, agora dotados de um maquinismo para descarga de jaulas, e à trincheira, que foi modificada totalmente para melhor ser adaptada à lide dos toiros em pontas, detenho-me ante o local da «inteligência», e logo uma figura surge no meu pensamento, que, por sua vez, recorda uma boa parte do tempo áureo do tauródromo do Campo Pequeno, cujo bosquejo histórico fica traçado nestas colunas. É a de Manuel Botas que recordo, o antigo toireiro, alto e de suíças brancas, boa pessoa, que dirigia as corridas, com o seu chapéu alto e sobrecasaca, a dar ao espectáculo o carácter sério que sempre deve ter.

Muitos nomes e uma infinidade de factos poderia aqui incluir. Mas quantas páginas seriam necessárias? As notas que reproduzo são as suficientes para se fazer uma idéia do que tem representado, para a distracção pública, a majestosa praça que se ergue no Largo do Dr. Afonso Pena, de Lisboa.

Em 1933 foram permitidos toiros de morte actuando Marcial, Villalta, Fermin Arillita, Ortega, Manuel Bienvenida e outros.

Para o final deixo a referência à Emprêsa Tauromáquica Lisbonense, que termina as suas funções em 1982, ano em que entregará a propriedade à velha e importante instituição de assistência que recolhe e educa crianças orfâs, a Casa Pia de Lisboa.

A dita emprêsa muito tem valorizado a praça, introduzindo-lhe melhoramentos consideráveis, tudo o produto duma dedicação bem merecida pelo espectáculo de ar livre em que com mais beleza se exalta aquela valentia que é tôda revestida de emoção estética, tanto da simpatia da multidão que com ela vibra, intensamente, de entusiasmo.

In FADO, MULHERES E TOIROS, Pepe Luis, Livraria Popular de Francisco Franco, Lisboa - 1945

28 DE JUNHO DE 1891 – PARIS: «GRANDE SUCESSO» NA SEXTA TOURADA DA TEMPORADA PARISIENSE (na imprensa francesa)

 

Bibliothèque nationale de France

Grand succès pour la sixième course de taureaux donnée dimanche aux Arènes de la rue Pergolèse.

Le Matëito et sa cuadrilla; José Bento de Araujo, le caballero en plaza; les picadores; Le Pouly d’Aygues Mortes et son quadrille ont, chacun pour leur part, contribué à ce succès.


Ils se sont tous montrés très brillants. Un amateur français a piqué un taureau à la mexicaine et a été également applaudi. Dimanche prochain, septième course avec une surprise que nos lecteurs apprendront cette semaine.

In LE DROIT - JOURNAL DES TRIBUNAUX, DE LA JURISPRUDENCE, DES DÉBATS JUDICIAIRES ET DE LA LÉGISLATION, Paris – 1 de Julho de 1891

13 DE JUNHO DE 1897 – RIO DE JANEIRO: TOURADA COM O CAVALEIRO JOSÉ BENTO DE ARAÚJO (na imprensa brasileira)

 



SPORT

Na praça de touros, grande funcção hoje, com a estréa do cavalleiro José Bento de Araujo.

In GAZETA DE NOTICIAS, Rio de Janeiro – 13 de Junho de 1897

A CAVALARIA TAUROMÁQUICA PORTUGUESA - CAVALEIRO JOSÉ BENTO DE ARAÚJO MENCIONADO


 

"FADOS, MULHERES E TOIROS"
Pepe Luiz, Lisboa - 1945

A CAVALARIA TAUROMÁQUICA PORTUGUESA

E a alta expressão do seu valor artístico gravado numa gloriosa história de séculos

O toireio eqüestre significou sempre uma escola de destreza demonstrada primitivamente nos torneios em que fulgiam galas e intervinham monarcas e aristocratas..

Os séculos foram rodando e obedientes ao pensamento de Platão, de que «o belo é o esplendor da verdade», os cavaleiros sorteavam reses bravas, aprumados e de figura bem construída, palpitantes de vida, cavalheirismo e galantaria. E arrogantemente, empunhando o garrochão, pelejavam inspirados na magnitude e exaltação de primores toireiros.

A arte do toireio a cavalo, provindo de épocas recuadas da história da Península Ibérica, criou raízes vigorosas na Pátria Portuguesa, onde progrediu de maneira profunda.

É vulgar chamar-se arte de Marialva ao toireio eqüestre. Esta denominação não tem rigorosa propriedade, por que o célebre titular que desempenhava as funções de Estribeiro-Mor de Sua Majestade D. José I não foi um lidador, mas um potente impulsionador dos métodos de ensinar cavalos e da forma mais apropriada à utilização dos mesmos animais por parte dos ginetes.

Os processos do Marquês de Marialva contribuíram muitíssimo para o aperfeiçoamento das artes e trabalhos vários do manejo dos cavalos e adestramento dos soldados para a campanha, e disso muito aproveitaram os cavaleiros que se entregavam à caça e a outras diversões e torneios sob os bons preceitos de bem cavalgar.

Desde tempos longínquos, que os portugueses não eram dispensados nas festas de toiros celebradas em Espanha, promovidas pela côrte, e onde toireavam e matavam o rojão

Sòmente nos princípios do século XIX apareceram alguns cavaleiros de sangue plebeu, desenvolvendo-se depois o profissionalismo, sem, contudo os fidalgos deixarem de toirear nas magnificentes  corridas organizadas para comemoração de datas históricas, coroações, casamentos, e baptizados reais, e ainda em festejos de significado filantrópico.

No decurso aproximado de século e meio, alguns nomes ficaram exarados nos fastos da arte de toirear a cavalo: Duque do Cadaval, os Sedvem — grandes companheiros do rei D. Miguel de Bragança, que também toireava, servindo-se de fogosas montadas — D. João de Meneses, Marqueses de Castelo Melhor e de Belas, Diogo de Bettencourt, Visconde das Galveias, Carlos Relvas, D. António de Portugal, Conde da Esperança, José Casimiro Monteiro, Carlos Cipriano Batalha, Conde de Fontalva, Manuel Mourisca, Alfredo Tinoco, Alfredo Marreca, D. Luiz do Rêgo, Conde de S. Martinho, Vitorino Fróis, Joaquim Alves, Fernando de Oliveira, José Bento de Araújo, Simão da Veiga (pai), D. Rui da Câmara (filho do Conde da Ribeira), Manuel e José Casimiro de Almeida, Conde da Tôrre, Adelino Raposo, Morgado Covas, Eduardo Macedo, D. Alexandre e D. João de Mascarenhas e outros.


O momento das cortesias numa corrida de gala, no Campo Pequeno, vendo-se, no primeiro plano, os cavaleiros Simôes Serra, Manuel Casimiro, José Bento de Araújo, Fernando de Oliveira, Joaquim Alves e Eduardo Macedo.

Passando em revista os feitos assinalados em peleja heróica com os toiros, encontramos páginas doiradas escritas nas arenas não apenas do México, mas também da Espanha, França, Brasil, Argentina, e de algumas cidades africanas, pelos cavaleiros de Portugal, que, de casaca de sêda e brocados de oiro, tricórnio emplumado, sujeitando cavalos de raça e lidando reses bravas, nunca deixaram de realizar fainas arriscadas e temperadas por uma refulgente arte. E em tôda a parte arrancam entusiasmos ferventes e alcançam um predomínio justificador da felicíssima frase do ilustre escritor e dramaturgo, Presidente da Academia das Ciências de Lisboa, Dr. Júlio Dantas: «Uma guitarra nas mãos, um bom cavalo entre os joelhos, um toiro pela frente, e aí temos o português!»

In FADO, MULHERES E TOIROS, Pepe Luis, Livraria Popular de Francisco Franco, Lisboa - 1945

AS TOIRADAS NO SÉCULO XVIII


 


"FADOS, MULHERES E TOIROS"
Pepe Luiz, Lisboa - 1945

AS TOIRADAS NO SÉCULO XVIII

Sendo o reinado de D. João V caracterizado pelo fausto e magnificência da côrte, os festejos e os divertimentos, em que intervinha a assistência real, não podiam também deixar de ser assinalados pelo luxo e grandeza.

Estava indicado que seriam as toiradas os principais números do programa, já pelo que elas tinham de tradicional, já pelo que possuíam de emotivo, de belo e atraente.

Nas toiradas residiram sempre as preferências  e as paixões dos portugueses. Era nelas que os mais astutos, os mais valorosamente decididos desciam à liça, mostrando à sua dama que o amor estava tão radicado no seu coração, como a arte de lidar toiros lhe subjugava a alma de ardentes aficionados.

Como nas épocas anteriores, toireava-se para triunfar das feras e do amor…

Uma diferença sòmente se registava no comêço do século XVIII: a faustosidade nas corridas de toiros reais, que não era inferior àquela que Filipe I de Portugal e Filipe II de Espanha fêz marcar nas festividades que organizou por ocasião do seu reinado.

Já no meu livro Ao Estribo, fiz referência ao aparato de que as toiradas começaram a revestir-se no domínio dos Filipes.

Em tardes de corridas expunha-se um deslumbrante cerimonial e dos palanques e das janelas dos palácios, junto dos quais tinha lugar a função taurina, pendiam ricas tapeçarias recamadas de oiro. A madeira com que construíam os palanques era doirada, não faltando as sanefas e cortinas de valiosíssimos panos de sêda e de brocado de Flandres.

Na época de D. João V, o Magnânimo, até pouco além do meado do século XVIII, acentuaram-se as galas de forma que as corridas de toiros continuaram a ser reputadas de grandes acontecimentos.

O cavaleiro constituía o fulcro de tôdas as atenções.

Os cavaleiros tauromáquicos foram e são os ilustres varões que evocam um passado glorioso e hoje se impõem como os mais lídimos representantes daqueles ousados que deram o cunho de beleza e valentia aos torneios e lutas, por meio dos quais se mediam a coragem e a destreza.

O cavaleiro, seja amador ou artista, reproduz, no seu clássico labor, o requinte de elegância, o valor ingénito duma raça que sempre se afirmou ante os mais perigosos adversários e os maus duros obstáculos.

Os portugueses foram sempre assim. Quando as naus seguiam uma rota de mistério, a tripulação cantava o fado, tangendo as suas banzas; e, na volta das conquistas em África e na Índia, vinham defrontar-se com os toiros.

Também a nota de garbo e de arrôjo, assumida pelo cavaleiro, concorreu sempre poderosamente para o conjunto de beleza que tanto realce fornece a uma corrida de toiros, cuja feição primitiva nunca se afastou da lide eqüestre.

A arte de lidar, a pé, reses bravas assenta sôbre bases ensaiadas e desenvolvidas pelo toireio a cavalo.

Tanto a lide pedestre como a eqüestre irmanam-se actualmente, num tal grau de perfeição, que leva a acreditar os portugueses de consumados toireiros a cavalo e os espanhóis sublimes no trabalho da infantaria.

Há escolas de toireio, e magníficos estilos nelas inspirados. Tanto o toireio a pé como a cavalo dispõem dos seus princípios, leis, processos que nada têm que ver com a nacionalidade do toireador, mas especialmente com a perfeição com que é executado. Até agora, no autêntico toireio a cavalo, ainda não houve quem ultrapassasse os lusitanos.

Pode ser que no futuro venha a luzir algum astro novo. Pode ser. Por enquanto não dei por tal supremacia.

O impulso dado em Portugal às corridas de toiros, na primeira metade do século XVIII, provocou o aparecimento de sublimes figuras, como D. Jaime de Melo, o terceiro Duque de Cadaval, que legou aos seus descendentes ricas pearas de gado, cuja bravura e corpulência não são desconhecidas dos portugueses.

O referido duque rojoneava com perfeição e, no toireio a pé, mostrava valentia e conhecimentos tais, que executava com o estoque a sorte já nesse tempo conhecida por estocada de mete e saca, que hoje em Espanha não se pratica com freqüencia.

O Marquês de Marialva, que foi um exímio picador, fêz ligar, desde essa época, o seu nome à tauromaquia e de tal sorte que toireio eqüestre é ainda hoje denominado a Arte de Marialva.

Ora, o Marquês de Marialva foi um grande mestre de equitação; ditou leis e fêz operar grandes modificações em tudo que à cavalaria dizia respeito.

Até na indumentária dos equites êle introduziu aperfeiçoamentos.

Como não podia deixar de ser, na arte de toirear a cavalo também se registou um progresso que dia a dia vem mostrando novos e iluminados processos que jamais deixaram de primar, em todos os seus pormenores, por uma inexcedível galhardia e vistosidade.

Há um facto que merece referência especial: nesse tempo áureo, nenhum toiro vinha à peleja, que não tivesse seis anos de idade e que não trouxesse a cornamenta desimpedida de qualquer atavio. As hastes eram limpas e aguçadas, e a lide tinha a finalidade lógica a morte do toiro.

Hoje, em Portugal, ainda se anda a discutir se de novo o toiro deve ir à praça en puntas e se se há-de matar ou não.

Tudo isto é um reflexo da época.

Actualmente é raro sair do toril um bicho com idade superior a três anos. É que hoje atravessam as bancadas da praça uns indivíduos a apregoarem: Água fresca ou capilé, cá estão sandwichs ou bolinhos de amor!...

Não pense o leitor que em Espanha se passam casos de moldes diversos. Não, senhor.

É freqüente verem-se uns vendedores vestidos de branco, com certos ares amaneirados, feminis, a incomodarem os ouvidos dos espectadores: — Paquetes de almendra tostá y pelá!

Já lá vai o tempo do botijos de cassaya!...

Mas o toireio a cavalo tem muito que se lhe diga pela capital importância oferecida nos mais pequenos detalhes.

À alta concepção que sempre revelou, impõe-se, aos que praticam tão sublime arte, juntar o absoluto respeito pela tradição e uma vigorosa personalidade própria dos portugueses de rija têmpera que sempre exerceram predomínio no toireio eqüestre.

In GADO, MULHERES E TOIROS, Pepe Luis, Livraria Popular de Francisco Franco, Lisboa - 1945

7 DE FEVEREIRO DE 1897 - RIO DE JANEIRO: PUBLICAÇÃO A PEDIDO DOS CAVALEIROS ALFREDO TINOCO DA SILVA E JOSÉ BENTO DE ARAÚJO (na imprensa brasileira)

 


PUBLICAÇÕES A PEDIDO

Agradecimento

Os distinctos artistas tauromachicos Alfredo Tino e José Bento (de Araújo) pedem-nos a publicação do seguinte:

Alfredo Tinoco da Silva e José Bento de Araujo, tendo regressado do Rio de Janeiro, onde trabalharam como artistas tauromachicos, vêm, embora um tanto tarde, manifestar o agradecimento de que se acham possuidos para com todos que na capital da Republica Brasileira lhes deram as mais assignaladas provas de amizade e de apreço.

Não podem deixar de se referir em primeiro logar á imprensa fluminense, que tanto os distingiu, exaltando-lhes os meritos artisticos e dando-lhes coragem e incitamento pela seriedade da sua critica.

A Imprensa do Rio de Janeiro deixou-nos penhorados pela fórma amavel com que sempre nos tratou, contribuindo assim para o luzimento e apparato dos varios torneios que alli demos.

Não podemos tambem olvidar o bom e generoso publico d'essa capital, que nos distinguiu com os seus applausos e as suas saudações enthusiasticas, immerecidas. de certo para quem, como nós, não passa de dous modestos artistas.

Agradecemos, po ultimo, a todas as collectividades que nos honraram com a sua sympathia, a todos os particulares que nos auxiliaram para o cabal desempenho da nossa missão, a todos finalmente que nos dispensaram favores de tal ordem que nem toda a gratidão que pudesse brotar dos nossos corações seria sufficiente para compensar.

É possivel que dentro em breve voltemos ao Brasil. Se o fizermos, como esperamos, teremos então occasião de agradecer pessoalmente a muitos cavalheiros d'ahi a sua affectuosa amizade.

Por agora limitamo-nos a este agradecimento, que é a justa expressão do que sentimos, o reflexo do que se nos passa na alma, o cumprimento de um dever sacratissimo que nós tinhamos forçosamente de fazer, seguindo os dictames da nossa consciencia.

A todos, pois, um leal e franco aperto de mão.

Lisboa, 7 de Fevereiro de 1897.

ALFREDO TINOCO DA SILVA.

JOSÉ BENTO DE ARAUJO.

(Do Atlantico).


In GAZETA DE NOTICIAS, Rio de Janeiro - 10 de Março de 1897

1 DE JANEIRO DE 1908 - RIO DE JANEIRO: O CAVALEIRO JOSÉ BENTO DE ARAÚJO MANDA PUBLICAR CARTÃO DE BOAS FESTAS (na imprensa brasileira)

 


1908


In JORNAL DO BRASIL, Rio de Janeiro - 1 DE JANEIRO DE 1908

28 DE ABRIL DE 1901 - SERRA DO PILAR: O CAVALEIRO JOSÉ BENTO DE ARAÚJO TENCIONA MANDAR CONSTRUIR PRAÇA DE TOUROS (na imprensa brasileira)


 

— Consta que José Bento de Araujo tenciona mandar construir, na Serra do Pilar, uma praça de touros.

A inauguração será em junho.

In JORNAL DO BRASIL, Rio de Janeiro - 28 DE ABRIL DE 1901