8 DE AGOSTO DE 1896 - BRASIL: AS TOURADAS NO RIO DE JANEIRO


Touradas no Rio de Janeiro

Na virada do século XIX para o XX, esses eventos atraíam centenas de espectadores

As touradas tiveram origem nos países da Península Ibérica. Mas se espalharam pelos territórios colonizados, onde passaram a ser praticadas nas mais diversas modalidades. No Brasil, o espetáculo se difundiu especialmente no fim do século XIX, quando existiam várias “praças de touros”.

Praça de Touros do Rio de Janeiro (ao fundo da rua Ipiranga, no bairro das Laranjeiras).

A chegada de José Bento de Araújo e Alfredo Tinoco, famosos cavaleiros tauromáquicos, atraiu grande público para as touradas e deu novo impulso a essa festa que começava a cair no gosto da população brasileira, principalmente da carioca.

Foi na capital da República que as touradas fizeram mais sucesso. Na Divisão de Periódicos da Biblioteca Nacional, há diversas publicações que atestam o status que a atividade ganhou com a vinda dos toureiros portugueses. O sucesso fez com que elas passassem a ser notícia em vários jornais da época, culminando, em 1896, com o lançamento do periódico Sol e Sombra, que refletiu o entusiasmo dos cariocas. Apresentando-se como um “órgão da arte tauromáquica” e uma “folha para ricos e pobres – se ricos e pobres quiserem dar por ela 200 réis”, o jornal mencionava o crescente interesse dos cariocas pelo “vibrante divertimento hispano-lusitano” e celebrava o êxito da empreitada:

... se só agora o Rio de Janeiro consente em assistir a touradas e se já vai a elas com a mesma alegria e a mesma impaciência do público português e espanhol nas tardes destas funções inteiramente suas, – é porque o Rio de Janeiro só agora pode assistir a verdadeiros torneios e perceber a graça bizarra e todo o encanto deste divertimento popular, porque só ele tem o condão estranho de confundir, no mesmo momento, o entusiasmo do homem rude do povo com o do mais correto homem do mundo.

O semanal crítico-literário A Bruxa também tratou do assunto em suas páginas. Com texto de Olavo Bilac e ilustrações de Julião Machado, a publicação fez eco ao entusiasmo do público ao divulgar a “importante corrida de touros” ocorrida no sábado, dia 8 de agosto de 1896. A partir de então, A Bruxa passaria a publicar os croquis das touradas. O periódico Dom Quixote, de Ângelo Agostini, também noticiou os eventos, com direito a ilustração do próprio pintor.

Assunto de muita discussão, as touradas fazem sucesso até hoje nos países ibéricos. Aqui no Brasil, a prática perdeu força ao longo dos anos, mas se manteve viva em países como Peru, México, Guatemala e Equador. Uma das formas mais tradicionais dessa prática consiste em atrair o touro com o agitar de uma flanela vermelha (muleta) para golpeá-lo com uma bandarilha – haste de madeira com um arpão na ponta – quando ele se aproxima. O touro é atraído e golpeado sucessivamente até o golpe final, que o leva à morte. Os aspectos violentos e sádicos do ritual angariaram opositores de várias organizações protetoras de animais e estimularam o surgimento de organizações internacionais contra a prática de touradas, que fazem campanhas anuais de conscientização em várias cidades do mundo.

Fabrício Alexandrino

FONTE: Revista de História, Brasil.

18 DE AGOSTO DE 1892 - LISBOA: INAUGURAÇÃO DA PRAÇA DE TOUROS DO CAMPO PEQUENO


Praças de touros em Lisboa

Por muito que se tenha escrito e discutido sobre tauromaquia, ainda não foi possível até hoje, com verdade, saber-se quando teve inicio a lide de touros em Portugal, pois que, segundo se afirma, esse genero de toureio, já vem de epocas remotas, mesmo a preceder os circos de Roma. Na edade media, seculo XI, foi aproveitado o touro para brigar com cães, espetaculo este muito apreciado, n’essa epoca, pelos arabes.


Das minhas investigações minuciosas sobre a luza tauromaquia, muito especialmente na capital, tirei as seguintes conclusões veridicas, pequeno subsidio para a historia do toureio em Portugal:

D. Sancho II, em 1258, foi um grande entusiasta por touradas, chegando a farpear touros a cavalo, com bastante aficion, e em 1451, quando do casamento de D. Leonor com Frederico III, um dos numeros mais interessantes dos festejos, em Lisboa, foi a tourada realisada com o maximo esplendor e riqueza, n’uma praça improvisada nos terrenos junto ao Paço Real.

El-rei D. Sebastião, mandou construir em Xabregas, no ano de 1578, uma praça de touros e em 1647, foram promovidas brilhantes touradas na Praça do Rocio, bem como no Terreiro do Paço, em 1687.

Em 1739, foram lidadas reses bravas n’uma praça que o Marquez de Louriçal mandou construir junto ao seu palacio, no Largo da Anunciada.

Em 1738, na Junqueira, foi inaugurada uma praça de touros, demolida em 1879 e no local onde presentemente está situado o jardim da Estrela, n’um festival promovido pelas religiosas do Mosteiro de Sacavem, foram corridos touros em 1763.

Com enorme concorrencia e um entusiasmo extraordinario, inaugura-se em 4 de Julho de 1790 a praça do Salitre, que funcionou até 1830, e a 3 de Julho de 1831, efectua-se a primeira corrida de touros no Campo de Sant’Ana, á qual assistiram D. Miguel e sua irmã, a infanta D. Maria d’Assunção. Os lidadores n’essa tarde, foram os espadas Sebastião Garcia e Pedro José Rodrigues; cavaleiros: João Ferreira Grilo e Antonio Maximo de Amorim Velozo; bandarilheiros: Carlos José Rodrigues, Romão Maria Tornazeiro, Francisco José Rodrigues, José Maria Mendonça, Antonio Roberto, Joaquim Ferreira Grilo, Joaquim Emigdio Roquette e Antonio Bacharel; um grupo de forcados composto de valentes pegadores e quatro pretos, para o intermedio comico.

LISBOA: A antiga arena da Praça da Alegria.

Até Janeiro de 1889, data em que foi demolida a saudosa praça, deram-se numerosas corridas, sempre com bastante entusiasmo, pois n’essa epoca eram as touradas o unico divertimento onde o publico acorria em grande massa.

Durante tres anos não houve touradas em Lisboa, e a 18 de Agosto de 1892, foi inaugurado solenemente o grande taurodromo do Campo Pequeno, com o seguinte cartaz: 12 touros de Emilio Infante da Camara; cavaleiros: Alfredo Tinoco e Fernando Oliveira; bandarilheiros: Vicente Roberto, Roberto da Fonseca, José Joaquim Peixinho, João Calabaça, Rafael Peixinho, João Roberto e os hespanhoes Filipe Aragon (Minuto) e Vicente Mendez (Pescadero).

Esta praça que importou em 161.200$00, é pertença de um grupo de acionistas, com o direito á propriedade e terreno e o privilegio das touradas, bem como o dever de entregar á Casa Pia de Lisboa, a quantia de 3.500$00 por ano e a doação da praça a esta instituição, ao fim de 99 anos, que terminam em 1991.

Não consta que tivesse havido outras praças de touros em Lisboa, alem das que menciono n’este artigo, sendo certo que em 1893 foi construida a de Algés, por ocasião da greve dos cavaleiros, José Bento de Araujo, Alfredo Tinoco, Fernando de Oliveira e Manoel Casimiro de Almeida, que já todos dormem na ultima jazida, após tantos trofeus gloriosos, em tardes de inolvidavel recordação.

In Touros - Arte Portugueza, José Pedro do Carmo, Lisboa - 1927.

10 DE AGOSTO DE 1889 - PARIS: A PRIMEIRA TOURADA NA PRAÇA DE TOUROS DO BOIS DE BOULOGNE



A primeira tourada da "Gran Plaza de Toros" do Bois de Boulogne ocorre no sábado 10 de Agosto de 1889.


No domingo 28 de Agosto de 1890, os forcados africanos substituem os das Landes.

Na quinta-feira 9 de Outubro é realizada a primeira corrida nocturna.

No sábado 11 e no domingo 12 de Outubro, depois da tourada, é apresentado às 20:30 nas arenas, um concerto. A orquestra, composta por 160 músicos, toca obras de Berlioz, Gounot, Camille Saint-Saëns, Auber, Gaston Salvayre, etc.

A época de 1891 começa no domingo 24 de Maio e termina no domingo 8 de Novembro.

No domingo 5 de Julho é apresentada uma personagem inédita. Eis o relato do jornal diário parisiense Le Figaro (na secção "Correio dos Teatros"): "Para além das atracções habituais, que proporcionavam a presença de Valentín Martín, Le Mateito, os toureiros das Landes e os 'picadors', muito aplaudidos, é necessário mencionar o 'great event' da jornada com o aparecimento de Mademoiselle Gentis, a escudeira de alta escola, que acaba de realizar uma autêntica proeza. Foi a primeira a actuar, e combateu o touro com uma tal ousadia, que foi longamente aplaudida e coberta de flores. O habilidoso cavaleiro (José) Bento de Araújo partilhou o triunfo da charmosa escudeira."

A época de 1892 só começa no domingo 26 de Junho.

Todas as quintas-feiras e domingos, 10.000 a 15.000 pessoas deslocam-se às "arenas" de Paris para aplaudir Angél Pastor, Le Pouly, Le Mateїto, Francisco Granja, Juan Ripoll, Marius Monnier e os cavaleiros "en place" (José) Bento de Araújo e Mademoiselle Maria Gentis.

Na terça-feira 4 de Outubro de 1892 o jornal Le Figaro escreve: "Apesar do mau tempo, havia muita gente nas arenas da Rua Pergolèse. A 28ª corrida de touros foi marcada pela alternativa de P. Frascuelo. Foi das mais movimentadas e das mais brilhantes. Os touros eram vigorosos e derrubaram por mais de uma vez os picadores. José Bento de Araújo e a charmosa 'caballera' Maria Gentis permanecem excepcionais. Esta última deve lutar não só contra o touro, mas também contra o seu cavalo, que continua a ser rebelde. Ela plantou duas farpas magistrais. Frascuelo, cuja chegada era impacientemente aguardada pelos aficcionados parisienses, não os desiludiu. Demonstrou um talento e uma coragem extraordinários. A quadrilha provençal de Marius Monnier, de Marselha, despedia-se do público parisiense. Deixou-lhe a melhor impressão e foi alvo de uma verdadeira ovação. Na próxima quinta-feira é a 29ª corrida com Frascuelo. Início dos forcados africanos, cujo trabalho algo fantasista agradou imenso, no ano passado, aos frequentadores da 'Plaza'."

As actividades da "Gran Plaza" de Touros deixam de ser publicitadas a partir de terça-feira, 18 de Outubro de 1892.


Não é realizada em Paris uma única tourada na época de 1893.

No dia 12 de Janeiro de 1893, a Sociedade Anónima da Gran Plaza de Touros do Bois de Boulogne, com o capital de 5.000.000 francos, declara a falência.

As peças expostas no Museu Tauromáquico são vendidas em leilões. Em Setembro, as arenas e dependências são vendidas por um preço ridículo e são demolidas.

Em 1899, a tentativa de organizar touradas revela-se um fracasso.

Em 1925 são efectuadas algumas corridas nas arenas de Paris.

Em Setembro de 1942 são realizadas mais algumas no (tristemente célebre) Vel' d'Hiv (Vélodrome d'Hiver), na capital francesa.

Fonte: Hubert Demory

1 DE ABRIL DE 1924 - JOSÉ BENTO DE ARAÚJO NA LISTA DOS GRANDES CAVALEIROS


LE CABALLERO EN PLAZA

Ce nom prodigieux évoque dans nos souvenirs un spectacle plein de grâce et de majesté.

En effet il en est peu, possédant à un plus haut degré - si j'excepte à juste titre la tauromachie espagnole qu'elle soit Novillada ou de Cartel - qui puisse faire vibrer les "afficionados" a los toros ou a los toreros, davantage que le caballero en plaza.

Nos amis de "tras los montes" l'ont si bien compris que le caballero en plaza est désormais de toutes les grandes solennités tauromachiques, et même royales: Mariage princier, bénéfice de la Croix Rouge Espagnole, Corrida de la Presse, de Charité, etc.

Le travail du caballero en plaza est né au Portugal, et cela est assez compréhensible. La péninsule ibérique, en donnant naissance à ces deux peuples pourtant si dissemblables de moeurs et de langage que sont les portugais et les espagnols, a voulu les unir sur le terrain où se rencontrent tous les braves gens, j'ai nommé celui que nous aimons, celui qui est sacré pour nous: "L'Aficion".

Tous les gouvernements qui se sont succédés au Portugal, que ce soit monarchie ou république, ont toujours été adversaires irréductibles, de la corrida avec mise à mort; ce petit peuple latin, moins heureux que le peuple d'Espagne, n'a pas su imposer sa volonté, et alors il a essayé de tourner la loi - la ruse n'est-elle pas l'arme des faibles? - en instituant la corrida portugaise, où s'il y a mort, cette dernière est considérée comme un accident involontaire et par conséquent non justiciable et non punissable.

De ce fait tout le monde est content, les aficionados et la S.P.D.A. portugaise; cette dernière existe aussi là-bas, aussi méchante que chez nous et ce n'est pas peu dire.

Bibliothèque nationale de France

Voici donc notre caballero en plaza, au milieu du redondel qui va devenir le théatre de ses exploits.

Permettez-moi de vous le présenter.

Jusqu'à cette année les caballeros en plaza que nous avons eu le plaisir d'applaudir étaient costumés comme on l'était sous le règne de Philippe IV d'Espagne, costume noir, chapeau marquis avec plumes blanches, catogan et perruque poudrée à frimas, bottes vernies à l'écuyère, petite épée de cour à poignée de nacre au ôté, etc., etc. C'est ainsi que nous vîmes Barajas, frère aîné du jeune matador du même nom et, avant la guerre, notre picador de réserve "Capsir" n'hésitait pas à se travestir de la sorte, quand il essayait d'exécuter les suertes du caballero en plaza.

C'est à dessein que je dis essayer, car le pauvre garçon n'était pas un as de la course portugaise.

Le picador espagnol actuel qui réussit le mieux ce genre de suerte se nomme "Badila", et est connu de la plupart des aficionados des trois pays latins: France, Espagne, Portugal.

Voici les noms des caballeros en plaza, qui dans ces 30 dernières années ont le mieux illustré la Course Portugaise. Je cite par rang d'ordre:

(José) Bento de Araujo;
Les "Casimira d'Almeida" (père et fils);
Isidoro Grané;
Marciano de Ledesma;
Don Ruy de Camara.

Voilà pour les écuyers, car il y a eu également des écuyères, ce furent dans l'aristocratie portugaise:

Mathilde Vargas de Zaheleta de Oliveira qui combattit devant la cour de son pays et enfin une gracieuse écuyère française, Maria Gentis.

Ce qui prouve que si notre pays de France a donné à l'aficion espagnole Félix Robert et les Pouly, il n'a pas voulu rester en retard auprès de l'aficion portugaise, puisqu'il lui a donné une de nos charmantes compatriotes; dans les milieux bien informés, on croit de plus que Mlle Musidora va travailler fermement ce nouveau genre de sport.

Les armes du caballero en plaza sont de deux façons.

La première est le rejones en jarpas ou javeline longue et le rejon de muerte ou de mort qui ne peut être employé qu'en France ou en Espagne, d'une façon officielle.

Il reste bien entendu que l'arme principale du caballero en plaza, dont on ne parle pas, mais qui demeure maîtresse de la situation, c'est le cheval.

Ce magnifique coursier n'a rien de commun avec les maigres et lamentables haridelles de nos picadors, c'est généralement un pur sang andalou et qui connaît les "toros" aussi bien que son maître.

C'est dans la vigueur des jarrets de ce noble animal, dans la courbe gracieuse de son poitrail, dans la finesse et l'intelligence de sa jolie tête expressive, que va résider la beauté de la lutte, qui va lui permettre de sauver sa vie, tout en assurant celle de son maître lorsque tous deux se lanceront en duel faroule contre le non moins noble animal qui a nom: "Toro de lidia".

Mais les clarines ont sonné, notre cavalier est en selle. Son petit galop d'essai autour du redondel vient de finir. la porte du toril vient de s'ouvrir pour laisser passer le toro.

C'est l'instant tragique et délicieux entre tous pour le véritable aficionado, les deux adversaires sont dignes l'un de l'autre et nous admirons le caballero en plaza comme le digne descendant du "Cid Campéador" dont il porte le titre et continue le chevaleresque emploi.

Cessons ce lyrisme et entrons dans la partie technique du travail qui va se dérouler sous nos yeux.

Voici les principales manières de placer les rejones:

1º La suerte de tienta ou de cara (de face);

2º La suerte a tira ou a estribeira (a toro arrêté);

3º La suerte a Media-Vuelta (au demi-tour).

Pour la première de ces suertes, le caballero attend à gauche, et à 50 pas de la porte du toril, la sortie du toro.

Il va à la rencontre de l'animal par une marche oblique et assez lente, et a jurisdiccion, il cloue son rejon, éperonne vivement et passe sur le côté droit du toro.

Un capeador détourne le bicho si besoin est. C'est la suerte que les cavaliers exécutent dès le début de la course, la plupart du temps, et c'est pour cette raison que les portugais l'appellent à porta gaiola.

La seconde suerte se différencie de la précédente en ce sens qu'ici le caballero se dirige vers le toro arrêté au lieu de l'attendre ou de marcher à sa rencontre.

En somme, elle consiste pour le cavalier, à passer au grand galop, de la gauche à la droite du toro, en posant le rejon quand il arrive à la hauteur de la tête de l'animal.

Il est défendu de piquer si le toro n'humilie pas pour frapper.

Enfin, pour la troisième suerte et pour les toros difficiles, le caballero en plaza doit agir par surprise. Il se place à quelques pas derrière le bicho et sur le côté droit, court vers lui et quand l'animal se retourne, il cloue le rejon et s'enfuit.

Le toro a exécuté un demi-tour pour faire face à l'attaque, d'où le nom donné à la suerte "Media-Vuelta" au demi-tour.

Voilà donc succinctement exposées les différentes suertes du caballero en plaza, peu connues à ce jour.

Mais un jour, il vous sera donné de voir le prince des caballeros en plaza de l'heure actuelle, celui dont le nom est sur toutes les lèvres et dans bien des coeurs: "Don Juan Carnero".

Qui n'a pas vu Carnero n'a rien vu, il est la grâce, le courage, l'élégance, la distinction faite homme.

Beaucoup d'entre nous l'ont vu au cinéma, dans le film de "Sol y Sombra", qu'il tourna avec Musidora, mais c'était un rôle de torero à pied, il faut le voir à cheval et au naturel.

Il fut admirable à Dax et à Bordeaux, tout comme à Madrid et à Séville, rompant avec la tradition, il ne s'affuble pas du pourpoint en velours noir de Philippe IV, mais su seyant et si pittoresque costume de cavalier andalou, et quand vous le verrez "vestido de corto" vous aimerez la Course Portugaise, digne corolaire de la Course Espagnole et son égale par bien des points, de ce qui touche et exhalte notre âme latine, toujours sensible à la beauté, à la lumière, à la grâce, aux couleurs et à la bravoure de la "Fiesta Brava".

Henri LOUSTEAU, Secrétaire Général du Taureau-Sport Bordelais

In AFICION, ORGANE OFFICIEL DES SOCIÉTÉS TAURINES DE FRANCE ET D'ALGÉRIE, Marselha - 1 de Abril de 1924

1 DE NOVEMBRO DE 1909 - LISBOA: PRAÇA DO CAMPO DE SANT'ANNA - BERÇO DOS GRANDES CAVALEIROS PORTUGUESES...



CAMPO DE SANT'ANNA

Recordações de então


Arquivo Municipal de Lisboa

Ao tratarmos dos cavalleiros e do toureio a cavallo - o toureio portuguez por excelencia -, seja-nos permitido divagar um pouco, e primeiro que tudo, ácerca das condições em que trabalhavam antigamente esses artistas.

Ao passo que a principal preoccupação do toureiro equestre de hoje são os cavallos de combate, ha cincoenta annos era o que menos preoccupava os lidadores d'esse tempo.

João Sedvem, Antonio Sedvem, Pedro Sedvem e José Caetano de Brito (NOTA: José de Brito, que teve a sua época no Campo de Sant'Anna, foi um artista de conhecimentos, e que recebeu morte quasi instantanea na corrida de inauguração da antiga praça de Setubal, a 29 de maio de 1841: um touro, desmontando-o, levou-o de encontro á parede de resguardo do publico, fracturando-lhe o craneo), por exemplo, nunca conheceram a necessidade de ter que sustentar cavallos durante todo um inverno para poderem tourear no verão seguinte; quando tinham que trabalhar, iam ao primeiro alquilador que se lhes deparava, e alugavam um ou dois cavallos.

Diogo Bittencourt, Manuel de Mesquita e Francisco Batalha, ainda procederam de egual fórma por muito tempo.

O unico que nunca montou cavallos alugados, foi Antonio Maximo de Amorim Vellozo.


E, seja dito de passagem, n'esses tempos de saudosa memoria, lidavam-se touros a valer - d'esses que, quando sahiam do curro e se collocavam no centro da arena a sacudirem-se da terra que traziam em cima de si, faziam estremecer até o proprio espectador!

Francisco Batalha em certa tarde teve que ir tourear a Almada. Os cavallos que alugára em Lisboa, por qualquer motivo, não appareceram. E essa circumstancia, que hoje impressionaria um collega, não incomodou nada a Batalha: desceu rapidamente a Cacilhas, adquiriu na primeira cocheira dois cavallos, e entrando na arena á hora marcada só deixou de cumprir o programma no respeitante ás cortezias, porque as montadas não ladeavam.

Agora, porém, já não succede assim. E se nos disserem que este ou aquelle artista fez trinta ou quarenta corridas n'uma época e que o lucro de tanto trabalho e tanto risco não lhe chegou para o prejuizo que teve na compra e venda de montadas, temos que nos calar, porque sabemos que é verdade!


É certo que o publico d'esse tempo era menos exigente do que o actual; mas não é menos verdade que os toureiros antigos sabiam mais da arte de equitação do que a maioria dos actuaes, ao ponto de não terem cavallos proprios e tourearem perfeitamente e com a maior facilidade em cavallos de aluguer, nem dando então o triste espectaculo de que somos testemunha em muitas occasiões actualmente, do artista ser tocado pelo numero de ferros que colloca!

O que succedia, porém, era haver determinados alquiladores que tinham melhores cavallos do que outros, o que fazia com que lh'os preferissem, dando o caso ás vezes occasião para a bella intrigasinha. E quando então já existia, não é de admirar que ella agora ande por ahi tão accêsa como anda...

É curioso vêr o que nos diz um jornal de ha quarenta e oito annos, o Portuguez de 10 de agosto de 1861, sobre um e outro assumpto:

"N'este negocio dos cavalleiros tem havido uma intriga nojenta contra os srs. Mesquita e Silveira (NOTA: Silveira era um amador da época).

"Affirmam-nos que o sr. João Sedvem, de accôrdo com o sr. Diogo Bittencourt, tem procurado por todos os modos evitar que os srs. Mesquita e Silveira vão picar. O sr. Sedvem não anda bem n'este negocio, e o seu procedimento é improprio de quem tantas provas tem recebido de agrado por parte do publico do Campo de Sant'Anna. Diz-se que o sr. Diogo tratou de alugar para si alguns cavallos, que os srs. Mesquita e Silveira queriam tambem alugar, e de que o sr. Bittencourt não carecia, porque não vae picar n'essa tarde.

"Felizmente este facto não ha-de impedir que vão picar os srs. Mesquita e Silveira, e os empenhos do sr. Sedvem para que não picasse o sr. Mesquita foram baldados, sendo digno de louvor o modo porque andou o sr. governador civil n'esta questão."

Isto, entretanto, succedia ha quasi meio seculo, no tempo em que os senhores governadores civis se mettiam nos negocios de touros. Mas essa época já lá vae: hoje tão elevadas personagens, no respeitante ao popular divertimento, pouco mais se incommodam do que... a ir assistir ao espectaculo!

Os alquiladores que mais cavallos alugavam para tourear eram José Amador, José Caetano, o Bairro Alto, José Bento (de Araújo) e José Maria, o Cabelleireiro, este estabelecido na Rua Larga de S. Roque e os restantes no Poço do Borratem. Era no Cabelleireiro que geralmente se encontravam as melhores montadas, e aonde José Caetano de Brito as alugava sempre; os Sedvem preferiam as de José Bento (de Araújo) e José Caetano. Mais modernamente, o Antonio Hespanhol e o Ezequiel de Carvalho tambem alugavam cavallos.

Vellozo, Sedvem, Brito, etc., ganhavam oito libras por corrida; Bittencourt, Mesquita e Batalha fizerem logo subir o preço para dez e dezeseis libras, consoante tivessem que lidar dois ou quatro touros.

João Sedvem, Diogo Bittencourt e Francisco Batalha, foram artistas por demais valentes e arrojados, como Manuel de Mesquita foi o mais receoso de todos, apesar de bom toureiro. Mesquita, quando tinha que tourear, ia na vespera para o oratorio, onde orava até ao momento de ir para a praça.

Tempos houve em que se faziam cortezias por dóse dobrada em cada espectaculo, umas no começo e  outras ao terminar.

Comquanto cousa alguma explique as segundas - como talvez até as primeiras -, o que é certo é que não foi sem alguma difficuldade que se acabou com as ultimas, pelo costume em que o publico já estava de as presencear. N'esse tempo, porém, poucos eram os espectadores que sahiam da praça antes da corrida haver terminado por completo.

Observando-se o mesmo preceito tanto n'umas como nas outras, entretanto as finaes não decorriam com a seriedade que sempre se observou nas primeiras, ainda agora mesmo.

Depois de se lidar o ultimo touro, apenas os cavalleiros entravam no redondel e os bandarilheiros e forcados occupavam os seus logares em fila, era da praxe o rapazio saltar logo á arena, fazendo uma segunda corrida em volta dos lidadores.

E as cortezias terminavam, e o rapazio lá ficava, continuando com o seu simulacro de tourada, saltando ora para dentro da trincheira oara para a arena...

Tudo isso acabou!

Mas talvez por acabarem estas e outras pequenas cousas, a aficion vae diminuindo, mas diminuindo extraordinariamente, até ao ponto talvez de ás praças de touros se ter que dar outra applicação.

O Carnaval está por assim dizer agonizante, desde que de lembraram de o civilisar; o divertimento tauromachico, desde que perdeu o tom popular que tinha, com a sua liberdade e as suas piadas, para lá caminha tambem, e a passos agigantados...

As cortezias finaes acabaram com a ultima corrida da época de 1879.

Isso, porém, não impediu que o pequeno aficionado continuasse a divertir-se na arena por largo espaço de tempo ainda, sahindo d'alli ancioso por outra tarde de festa para tornar a brincar aos touros na propria praça.


Manuel Mourisca e Casimiro Monteiro foram os cavalleiros que iniciaram a revolução no toureio a cavallo, começando pela fórma de vestir.

Já poucos são os aficionados que se lembram da antiga farda - a casaca single, o collete simples, a polaina um tanto extravagante e o bicorneo de fivella dourada ou prateada na frente, com tres plumas, uma branca e duas azues.

Quem não  fôr do tempo d'essa toilette - que deve ter sido abolida ha uns bons trinta a trinta e cinco annos, pelo menos -, queira-a vêr nos retratos que damos adiante, de Casimiro Monteiro, Batalha, Antonio Monteiro e Augusto Calhamar. Por ahi o leitor fará uma idéa.

Foram aquelles dois artistas que introduziram a farda usada actualmente, chamada á Marialva, sem duvida muito vistosa e elegante, começando então tambem os cavalleiros a tourear só em cavallos proprios, e a apresental-os ajaezados com desusado gosto, como até então não era dado admirar.

No emtanto, Casimiro Monteiro foi o que a todos sobrelevou sempre, chegando o seu bom gosto ao ponto de adquirir chaireis com guarnições de ouro e prata, e arreios com peças dos mesmos preciosos metaes, alguns d'elles avaliados em mais de um conto de réis.

No dia da festa annual do estimado cavalleiro, havia sempre uma romaria de curiosos, aficionados e admiradores d'arte, ao corredor aonde se encontravam os cavallos, a examinarem as preciosidades artisticas que ornavam os corceis de José Casimiro Monteiro.

Manoel Mourisca tambem foi possuidor de um riquissimo arreio completo em prata macissa, avaliado em um conto de réis, offerta de um aficionado.

Pouco depois de Mourisca e Monteiro começarem a apresentar-se á Marialva, logo os seus collegas mais modernos os imitaram, ficando assim dentro em pouco tempo operada uma grande transformação na fórma de trajar dos nossos cavalleiros.

Comtudo, antes, de Mourisca e Casimiro Monteiro se apresentarem em publico com o novo trajo á Marialva, já Manuel de Mesquita tinha tentado a innovação, que não vingou, talvez por muito espectaculosa. Mas o antigo e considerado artista fel-o ainda com mais propriedade e rigor, visto que trazia tambem espada á cinta, que o acompanhava não só ás cortezias como quando toureava.

Para melhor completar a nossa noticia, continuamos a dar os perfis das individualidades que mais ou menos de destacaram no circo que vimos historiando:

O cavalleiro Manuel Mourisca foi justamente considerado o Mestre do toureio a cavallo.

Nascendo em Freixiendas, proximo de Ourem, a 14 de setembro de 1844, teve a guiar-lhe os primeiros passos na arriscada arte, o não menos artista João dos Santos Sedvem, que então dava leis Discipulo de tal mestre, não foi, pois, por favor que tambem alcançou a melhor classificação entre todos os mais distinctos collegas do seu tempo.

Mourisca, de um valor, serenidade e sangue frio sem egual, poupando os seus cavallos como ninguem, era inexcedivel e primoroso na execução de todas as sortes do toureio, sendo devidamente apreciado pelo publico entendedor.

Sem o querer, sem contribuir em cousa alguma para isso, viu formarem-se na sua época dois aprtidos entre o publico - um que lhe era favoravel, o da sombra, e outro, o do sol, que acompanhava Batalha. Ás vezes travavam-se verdadeiras luctas com as duas partes. O partido de Mourisca era todo pela arte e classisismo, o de Batalha pelo arrojo e valentia.

Mourisca foi eximio na lide a ferros curtos, que empregava sempre aos pares, pois reconhecia ser um erro o collocar um ferro de cada vez. Assim executou algumas vezes lides completas em corridas de seu beneficio.

Com a retirada de Mourisca, porém, tão artisitica fórma de tourear cahiu no desuso, não porque não tivesse razão de ser a opinião do mestre - que elle baseava e defendia em o bandarilheiro sahir sempre aos touros com um par de ferros de cada vez -, mas porque é mais difficil collocar um par do que meio, e a quéda de um ferro traz desaire para o lidador.

Manuel Mourisca ha muitos annos que se encontra retirado das lides; entretanto, ainda em 1908, na tarde de 2 de agosto, veiu ao Campo Pequeno tourear dois touros, revelando-se o mesmo toureiro intelligente e de raro saber de então.


Alfredo Tinoco da Silva, que nasceu em Lisboa a 5 de Julho de 1855, foi o mais gentil e o mais garboso dos cavalleiros que teem pisado arenas portuguezas.

Enthusiasta pelo divertimento desde os mais tenros annos, foi na demolida praça do Campo de Sant'Anna que fez por assim dizer todo o tirocinio do toureio que tanto honrou, desde o logar de neto, que nunca mais foi desempenhado como por elle, até o de cavalleiro, em que por demais elevou a nobre arte de tourear a cavallo, quer no seu paiz quer no estrangeiro.

Apresentou-se em Hespanha, França e Brazil, por bastas vezes, causando sempre desusado enthusiasmo.

Tendo começado por tourear obsequiosamente n'uma ou em outra corrida, de tal fórma o seu trabalho distincto se foi radicando no gosto e apreço dos aficionados que, comprehendendo-o Tinoco, o levou mais tarde a abraçar a arte como profissional. Essa resolução não podia deixar de ser bem acolhida, como foi, devido aos muitos meritos do notavel lidador.

Em extremo elegante, vestindo com distincção tanto a farda de toureiro como a casaca aristocratica, destacando-se a cavallo na arena como em passeio, Tinoco sobrelevou a todos os lidadores do tempo pela finura do seu toureio e raros conhecimentos.

Creando um publico seu, um publico especial, que via no brilhante artista o mais lidimo successor do celebre Marquez de Marialva, Tinoco vangloriou-se de poder contar com uma geração completa de admiradores, que o impunha ás emprezas em todas as corridas. Por isso, Tinoco só deixava de tourear quando não podia ou não queria.

Esse publico, porém, que tudo esquece, que glorifica artistas com a mesma facilidade como os inutilisa, um dia começou de hostilisar Alfredo Tinoco, tratando-o como a o mais infimo dos lidadores!

Tinoco, então, cioso do seu nome e do que valia, medindo o succedido em uma vil intriga, desgostou-se e começou a abandonar a arena. Não contente ainda, deliberou deixar o torrão patrio, não sabemos se em procura de novas glorias se da morte que havia de o fazer esquecer tanta ingratidão...

Fosse como fosse, ahi por outubro do anno de 1895 abandonava Lisboa, em direcção ao Brazil, sem tenção de voltar a tourear no seu paiz, vindo a fallecer no Pará a 16 de setembro de 1899.


Se o toureio a pé desde longa data vem atravessando grande decadencia, o de cavallo, porém, em todas as épocas tem estado florescente, sendo cultivado quer por artistas quer por amadores, alguns dos quaes da aristocracia, e todos o teem mantido de fórma a não poder notar-se o seu enfraquecimento; antes, pelo contrario, podemos mencionar que tem grangeado justa fama, até mesmo no estrangeiro, onde os cavalleiros portuguezes gosam da reputação de inexcediveis n'esta parte da arte tauromachica.

Um dos que mais concorreu para esse brilhantismo foi, sem duvida, D. Luiz do Rego, que descende de uma das mais illustres familias da sociedade portugueza.

Difficilmente elle esquecerá as provas de elevado apreço em que foi sempre tido na praça do Campo de Sant'Anna e na praça de Madrid, onde, em companhia de Tinoco, lidou touros em pontas, merecendo o mais enthusiastico applauso nosso e dos nossos visinhos. Muitas vezes o publico ficava indeciso se devia n'elle admirar mais a sua coragem e conhecimento da arte tauromachica ou os seus poderosos recursos como cavalleiro, pelo modo como dominava sempre o corcel que montava, despertando a admiração e applauso ainda dos maiores entendedores, a maneira como subjugava o famoso Leotard, o seu favorito cavallo de combate.

D. Luiz do Rego executou com proficiencia todas as sortes do teoureio a cavallo, algumas das quaes já haviam quasi cahido no esquecimento, e foi, tambem com Alfredo Tinoco, um dos cavalleiros contratados para inaugurar a praça da rua de Pergolèse, em Paris, em 1889. Tendo-se retirado do toureio pouco depois, foi geralmente sentida a sua falta.

O distincto toureiro, que conta actualmente cincoenta annos, nasceu em Lisboa a 31 de agosto de 1859, foi o companheiro inseparavel, em tardes e épocas consecutivas, de Alfredo Tinoco. Ambos começaram como amadores, e ambos terminaram como artistas.

Depois que se retirou da arena, tem-se apresentado uma ou outra vez, simplesmente em corridas de caridade.


Francisco Carlos Batalha nasceu em Lisboa a 18 de fevereiro de 1841. Foi um cavalleiro valente até á temeridade.

Conhecia as regras da equitação como poucos, sendo educado n'esta arte pelo professor Antonio de Figueiredo, a expensas do marquez de Castello Melhor. No toureio teve como mestre João dos Santos Sedvem, de quem recebeu as melhores lições, e que tinha verdadeira predilecção pelo discipulo.

Valente como era, essa qualidade fez-lhe crear um partido de admiradores tão numeroso como especial, que o idolatrava, frequentando simplesmente as corridas em que elle tomava parte. Esse publico era o do sol; e ás vezes tão fanatico se mostrava pelo popular toureiro, que ultrapassava os limites.

Certa tarde, por exemplo, em que toureava no Campo de Sant'Anna com Mourisca, e cabendo a cada artista dois touros, os seus amigos e admiradores não consentiram que Mourisca lidasse o segundo que lhe pertencia, exigindo que fosse toureado por Batalha! Apesar dos protestos, os partidarios de Mourisca não conseguiram fazer respeitar o programma!

Batalha foi um cavalleiro distincto, de recursos e muito saber, mas tambem immensamente infeliz. Póde dizer-se que durante o largo espaço de tempo que exerceu a sua profissão, mesmo depois dos cavalleiros começarem a ter cavallos proprios, nunca teve um animal verdadeiramente para toureio. Em compensação, não tinha duvida em montar o primneiro que lhe apparecia, e sahir com elle á arena! E quantas vezes o fez! De muito lhe valeu, para isso, os raros conhecimentos que possuia da equitação.

Uma doença cerebral pôz termo á vida do infeliz artista a 7 de abril de 1882, na casa que habitava nas Escadinhas de São Lourenço.


José Maria Casimiro Monteiro foi um cavalleiro habilidoso e elegante, digno companheiro de Manuel Mourisca. Nasceu em Lisboa a 8 de abril de 1850.

Conscienciosissimo no seu trabalho, nunca procurando as palmas nos artificios mas simplesmente em fazer arte, todo o publico estimava e respeitava Casimiro Monteiro como a poucos, classificando-o de artista completo. Toureava muito de cara e aproveitava bem as gaiolas, e foi no seu tempo o cavalleiro que com mais precisão executou a sorte á tira.

Lidando a ferros curtos, acompnhava a opinião de Manuel Mourisca, o Mestre, empregando sempre um par de cada vez.

É do conhecimento de todos o gosto que possuia na apresentação das suas montadas, chegando a reunir quatro rquissimos apparelhos de cortezias, bordados a ouro e a prata: isto só prova o amor que mantinha pela sua arte querida, adorando a carreira que seguira e de que era apostolo fervoroso.

Como n'outro logar dizemos, deve-se a Casimiro Monteiro a substituição dos antigos trajos de picaria, que os cavalleiros usavam, pelas vistosas e flamantes vestimentas de agora. Foi elle quem primeiro começou a usal-as, seguindo depois os outros o exemplo na adopção do trajo á Marialva, trocando as polainas pelas botas altas.

Casimiro Monteiro deixou de tourear ha muitos annos, em virtude da avançada edade e falta de vista.


Antonio Maria Monteiro foi um cavalleiro que teve algum renome, comquanto nunca chegasse a alcançar o grau artistico que na arte de Vimioso obteve seu irmão Casimiro Monteiro.

Muito destemido, chegando até a fazer alarde da sua valentia, Antonio Monteiro era dos artistas que annualmente mais corridas toureava.

Nas suas festas artisticas conseguia sempre fazer uma revolução no meio, taes eram as idéas mirabolantes que apresentava no cartaz para chamar concorrencia, sahindo-se geralmente bem succedido.

Antonio Monteiro nasceu em Lisboa a 13 de junho de 1850, vindo a fallecer de uma doença mental, no manicomio de Rilhafolles, a 5 de dezembro de 1888.


D'esse honroso grupo de cavalleiros que pisaram a extincta arena do Campo de Sant'Anna, é José Bento de Araujo actualmente o unico representante em exercicio.

Justamente consagrado pela critica e aficionados d'esse tempo, como ainda agora pelo publico que frequenta as nossas praças, José Bento (de Araújo) soube sempre impôr-se pela valentia e desejos de agradar, salientando-se muitas vezes ao lado de collegas de superior categoria.

José Bento de Araujo obteve em todas as épocas grande popularidade, o que, junto aos seus meritos incontestados, fez com que alcançasse um bom logar entre os mais distinctos cavalleiros portuguezes.

Rijo como poucos, alegre na arena, possuidor de invejaveis faculdades apesar dos seus cincoenta e sete annos, pois nasceu em Lisboa a 16 de janeiro de 1852 é ainda dos toureiros que presentemenet mais agrada e enthusiasma os publicos.

Como piadista é unico, fazendo ás vezes rir o publico a bandeiras despregadas, e correndo os seus ditos de bocca em bocca por largo espaço de tempo...


Augusto Calhamar Pinto e Silva, mais conhecido pelo Pintasilgo, embora alternasse com os cavalleiros mais antigos e de mais nomeada da sua época, nunca chegou a salientar-se. Entretanto toureou muito, quer em Lisboa quer nas praças da provincia, e principalmente na do Porto e Santarem, das quaes por bastas vezes foi emprezario.

Calhamar nunca teve cavallos de toureio: ou os alugava quando tinha que trabalhar, ou, em casos de grande aperto, recorria á primeira feira, onde comprava uma ou duas montadas, para logo depois as vender.

CARLOS ABREU

In SERÕES - REVISTA MENSAL ILUSTRADA, Lisboa - Novembro de 1909

7 DE JUNHO DE 1903 - SETÚBAL: O DIA DE "TROMBA LINDA"



TAUROMACHIA 

Campo Pequeno — Foi interessante e animada a corrida que hontem se realisou na praça do Campo Pequeno, não faltando ovações, algumas d’ellas, na verdade, bem pouco merecidas.

O clou da tourada consistia principalmente no certamen de gado bravo, embora o cartaz reunisse outros elementos valiosos.
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Tratava-se de ver quem era o lavrador que apresentava o touro mais bravo, visto que já se sabia qual tinha sido o feliz que possuia o mais lindo bruto que tem nascido nas Lezirias.

O publico esperou com impaciencia a entrada na arena do animal premiado.

Era elle um animal negro retinto, chamado “Carapuço”, mas que fica alcunhado de “Tromba Linda”, para todos os dias da sua triste vida.

Respeitamos muito a opinião do jury que concedeu o premio ao referido touro, por signal, manso como burro, que é das manadas do sr. Faustino da Gama; mas, francamente, o nosso voto seria para o segundo touro, de Emilio Infante, porque era um animal com uns pés muito bem feitos, bastante risonho e com uns olhos encantandores.

E n’isto de gostos não ha discussões.

Os dois touros bravos que appareceram foram o setimo, do marquez de Castello Melhor, e o oitavo, de Emilio Infante.

O que pregou mais sustos, pondo em fuga soldados da guarda municipal, policias, creados de servir e toda a gente, que estava na trincheira, foi o sexto, de Correia Branco, que saltou umas poucas de vezes as taboas, sempre com vontade de fazer mal.

Este é que, a nosso ver, merecia o premio.

De resto, o certamen não foi grande cousa.

O touro 5º, de Gama, cumpriu e era nobre, e o 3º, de Castello Melhor, tambem cumpriu no primeiro tercio, e nada mais.

Os cavalleiros José Bento (de Araújo), Fernando de Oliveira, Manuel Casimiro e Alves prenderam poucos ferros, sendo todos chamados e muito applaudidos.

Alves foi quem melhor figura fez na parte que diz respeito á equitação e a governo do corcel.

O mestre Faico bailou uns passes de muleta, não indo, comtudo, a compasso da musica. O que foi pena.

No ultimo executou um bom cambio.

Montes esteve bem com a muleta, especialmente no 6º, em que a faina foi muito laboriosa e luzida.

Os bandarilheiros estiveram diligentes, mas os touros muito apurados no primeiro tercio da lide, e na maioria mansos, chegavam sem faculdades ao segundo tercio.
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O José Russo pegou valentemente o 3º do curro.

O bandarilheiro Limeño, que, segundo parece, está praticando para moço de forcado, fez tambem uma rija péga de cara, e tão atrapalhado ficou com os derrotes do brutinho, que perdeu o seu habitual sangue frio. Pobre homem!

Estranhámos que a musica não fizesse ouvir os seus melodiosos sons n’um lance de tanto effeito, quando é tão prodiga em nos matar o bicho do ouvido depois dos mais terriveis bornaes.
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A praça estava cheia.

Assistiu a parte da corrida a rainha senhora D. Amelia.

Zé Jaleco

In O SECULO – 8 de Junho de 1903