3 DE JULHO DE 1904 - LISBOA: FESTA DO CAVALEIRO JOSÉ BENTO DE ARAÚJO NA PRAÇA DO CAMPO PEQUENO

 


Hemeroteca Digital CM Lisboa


Praça do Campo Pequeno

11.ª corrida

    Esteve por vezes animada a corrida effectuada no ultimo domingo, em beneficio do popular e estimado cavalleiro José Bento de Araujo.

    Os elementos de que dispunha o cartaz eram dos melhores, podendo até dizer-se que era uma corrida mais para satisfazer ao publico do que para ganhar.

    Os touros pertenciam ao reputado ganadero de Paucas, sr. Estevam de Oliveira, que enviou uma corrida superior, tanto em typos como no respeitante a tratamento, grandes e eguaes, e se não enthusiasmaram quanto a bravura, deve-se isso unica e exclusivamente á lide que lhes deram, pois foram recortados escandalosamente, deixando-os sem faculdades nenhumas logo após a entrada no redondel. E é isto que actualmente succede, quando um creador tem o arrojo e o gosto de apresentar touros de presença e de respeito!

    Dos cavalleiros, foi José Bento (de Araújo) quem teve as honras da tarde na lide do 5.º, que toureou com desusada valentia, e no qual collocou alguns ferros magnificos, principalmente um á tira, que causou grande enthusiasmo, pela fórma como preparou e consumou a sorte.

    Manuel Casimiro toureou tambem com vontade e foi muito applaudido, sendo colhido e quasi desmontado pelo 1.º touro, ao collocar o primeiro ferro, pelo motivo de muito apertar. No fim da lide, o publico chamou á arena o estimado artista, dispensando-lhe uma carinhosa manifestação de sympathia.

    Eduardo Macedo esteve bem na lide do 6.º, terminando com um curto superior, que lhe valeu uma justa ovação.

    Victor Marques, a quem José Bento (de Araújo) concedeu a alternativa no 3.º, não passou de regular, toureando pouco, por motivo do animal se inutilisar logo depouis de sahir á arena.

    Os espadas Algabeño e Machaquito, não fizeram prodigios: com as bandarilhas tourearam com pouco luzimento, e com o capote e a muleta estiveram pode demais desconfiados, e com poucas ganas de se arrimarem e parar. Ainda assim, foi no 6.º que a assistencia mais gostou de vêr Machaquito, em que esteve deveras valente, e a Algabeño no 9.º, no qual tirou um ou outro passe de muleta mais artistico e em que se confiou tambem mais que nos restantes.

    Dos bandarilheiros, Cadete e Rocha tiveram alguns pares que foram applaudidos; dos das cuadrillas dos espadas, Patatero e Moyano, que mais uma vez se evidenciaram dois bandarilheiros disctinctissimos.

    Os forcados, com pouca fortuna, sendo um dos do grupo conduzido á enfermaria bastante maltratado.

    A direcção, má.

    Ao sr. Manuel Botas se deve uma parte do insuccesso do gado, ou seja de não cumprir como devia, pois de fórma alguma devia consentir na arena cinco e seis artistas propositadamente recortando os touros para lhe tirarem as pernas, como aconteceu do primeiro ao ultimo da corrida.

    Assim todos dirigem.

    Da mesma auctoridade que usou para com José Bento (de Araújo) e Manuel Casimiro, quando pretendiam collocar ferros curtos no 8.º, a que com muita e justificada razão se negou, era assim que desejamos procedesse com os bandarilheiros hespanhoes, não consentindo aquelles consecutivos grupos de peões, sempre de capote na mão em volta dos touros, que só faziam o seu jogo inutilisando-os por completo para a lide com uma série interminavel de capotazos e de recortes.

    Colloque-se o sr. Botas no seu logar, e imponha-se, pois ainda ha quem veja, e n'essas occasiões não se sentirá desacompanhado, póde ter a certeza. E ainda n'esta tarde teve a prova.

    C.A. (NOTA: iniciais de Carlos Abreu)

In O GRANDE ELIAS, Lisboa - 7 de Julho de 1904