17 DE JUNHO DE 1894 - LISBOA: UMA CORRIDA NA PRAÇA DO CAMPO PEQUENO COM TOUROS MANSOS


Biblioteca nacional de Portugal

HIGH-LIFE

Sua Magestade El-Rei e o Sr. Infante D. Affonso assistiram hontem á tourada na praça do Campo Pequeno.

Sua Magestade era acompanhado pelo seu camarista o sr. Marquez de Fronteira e do seu ajudante de campo o sr. Antonio de Campos.

O Sr. Infante era acompanhado do seu official ás ordens o sr. capitão Albuquerque (VER NOTA NO FINAL DA PÁGINA).


Corrida do Campo Pequeno

Com uma casa fraca effectuou-se hontem na praça do Campo Pequeno a 11.ª corrida da epocha, sendo esta, egual a nove das que se têm dado durante a epocha; e isto não por culpa da empreza, porque essa tem sempre apresentado pessoal do melhor, mas sim por culpa dos lavradores que dão curros pessimos, apesar de bem pagos.


Na corrida de hontem tomaram parte os seguintes artistas:

Espada Joaquim Navarro "Quinito", Antonio Miranda "Pipo" e Mannel Sevillano, cavalleiros Alfredo Tinoco, José Bento d'Araujo e Fernando d'Oliveira e bandarilheiros João da Cruz Calabaça, João do Rio Sancho, Filippe Aragon "Minuto", Theodoro Gonçalves e Jorge Cadete.

Emquanto ao trabalho do espada "Quinito" foi o melhor possivel em toda a tarde tanto com bandarilhas como com a capa, simulando bem as mortes dos touros.

O 6.º touro que teve para bandarilhar a sós sahiu manso como um borrego, a ponto do publico protestar e ter de sahir outro touro quasi nas mesmas condições.

No 9.º touro que tinha sido bandarilhado admiravelmente por Cadete e Theodoro, foi passado de muleta pelo espada "Quinito", e depois de lhe simular a estocada de morte o touro correu atraz d'elle encostado á trincheira, onde o artista lhe fez um passe com a capa, cahindo o touro a distancia d'elle cinco passes.

Os tres artistas, "Quinito", Theodoro e Cadete, tiveram uma ovação.

O trabalho dos tres cavalleiros foi o melhor que podia ser com taes rezes.

Tinoco enfeitou o 1.º touro com cinco farpas bem collocadas; o 7.º enfeitou-o com tres farpas e quatro ferros curtos. Foi muito applaudido.


José Bento (de Araújo) enfeitou o 3.º touro com cinco farpas em sortes arriscadas.

No 10.º touro que nos disseram ser puro, e que saiu manso como um cordeiro, apesar de ser esperado por Calabaça, foi recolhido sem experimentar uma farpa do cavalleiro.

José Bento (de Araújo) foi applaudido pelo bem que toureou o primeiro, e pela boa diligencia que fez para farpear o segundo.

Fernando de Oliveira metteu cinco farpas no 5.º touro que lhe coube, e tres e um ferro curto no 12.º

Fernando de Oliveira foi muito applaudido.

Em resumo, os tres cavalleiros tourearam bem, tendo as honras da tarde Alfredo Tinoco.

Theodoro, Cadete, "Minuto" e Calabaça, tiveram sortes admiraveis que lhe valeram applausos.

Cadete teve um entorse n'um pé ao saltar á barreira.

Os bandarilheiros da quadrilha do espada pouco fizeram, sendo um d'elles colhido pelo touro na occasião de o citar para um cambio.

Os moços de forcado apenas fizeram tres pegas de cara dignas de se mencionarem.

Os touros, que para nada prestaram, pertenciam ao sr. commendador Paulino da Cunha e Silva. Estavam bem tratados, mas que em nada se pareciam com curros que já tem dado para differentes corridas.

A intelligencia hontem não foi das melhores, apesar da sua boa vontade.

O publico saiu descontente.


In DIARIO ILLUSTRADO, Lisboa - 18 de Junho de 1894

NOTA

Mouzinho de Albuquerque foi dado como amante de D. Amélia. Suicidou-se (para defender a honra de ambos ou um amor impossível?) depois de lavrar três cartas, incluindo a que endereçou à rainha.

Arquivo nacional TORRE DO TOMBO
Perdoe me Vossa Magestade e não me ache cobarde pelo que fiz. Mas ser tido em mau conceito, ser desprezado é mais do que posso. Não creio que o suicídio n'estas circunstâncias não seja um direito. Minha Senhora! 

(EXCERTO)

Arquivo nacional TORRE DO TOMBO
 D. Amélia escreveu muitos anos depois (em França) que não sabia se teria conseguido resistir aos sentimentos que nutria pelo militar português.