13 DE SETEMBRO DE 1914 – ESPINHO: UMA EXCELENTE TOURADA…


TOURADA

A que se realisou no dia 13 do corrente satisfez os espectadores. A's 16 horas e 45' deu o clarim o sinal para a luzida troupe de lidadores iniciar as cortezias. Estas foram á antiga portugueza. Os charameleiros com as suas trompas tomaram, segundo as regras estabelecidas, a testa do cortejo, e a seguir começaram as cortezias, que nesta tourada apresentaram Neto e Pagens e assim se tornaram mais brilhantes. O curro em geral satisfez.

Biblioteca municipal de Espinho

O 1.º bicho que pisou a arena, foi lidado pelo distincto cavaleiro amador João Marcelino, que colocou com toda a arte 3 ferros bons, e rematou a lide com 4 curtos.

Este cavaleiro mostrou bem o seu arrojo, e a qualidade muito apreciável, que vulgarmente se traduz pela frase — pau para toda a obra.

O 2.º boi foi bandarilhado com toda a mestria, e o valente grupo de moços de forcado rematou a lide, com uma boa pega de cára.

O 3.º boi coube ao já bem conhecido José Bento d'Araujo, que colocou 7 ferros e dos quaes 3 curtos, com a coragem e arte que lhe são peculiares.

Veiu a seguir outro cavaleiro tambem muito conhecido Manuel Casimiro, que castigou o boi com 5 ferros, dos quaes 2 curtos. Este boi ganhava terreno, e deu d'isso uma prova bem evidente, quasi que alcançando a bela montada deste cavaleiro, que mostrou neste lance toda a sua presença d'espirito, livrando o cavalo deste ataque. É um perfeito cavaleiro, muito conhecedor da sua arte.

O 5.º bicho foi lidado pelo destemido cavaleiro João Marcelino que colocou 7 ferros, sendo 3 destes curtos. A analise da lide dos cavaleiros fez concluir — o que era de esperar — que são todos uns finos artistas, muito conhecedores do seu oficio. Tecer-lhes encomios é portanto um pleonasmo. Basta só dizer que a lide foi muito boa. As sortes de meia volta, garupa, estribeira e á tira são o seu a, b, c.

Para não faltar ao programa, admirou-se no 6.º boi um belo salto de vara, e os bandarilheiros mostraram nele toda a sua coragem realisando quiebros interessantes.

Este bicho foi talvez atacado durante a viagem para cá de neurastenia aguda e manifestou-a na arena pelo horror á socidade (da sua especie) pois que se sentia bem na arena, e não queria de fórma alguma recolher ao touril.

Foi preciso que o valente João Marcelino o pegasse, e auxiliado pelos moços de forcado o subjugassem, para ser laçado e assim recolher ao seu hotel.

O 7.º boi quiz diferençar-se dos seus amigos e companheiros, abastando-se o bastante para tornar a lide bem dificil. Foi a mancha negra do curro que no geral, como disse, se deveu chamar bom. Este bicho era muito velhaco, pois que soube dissimular as suas más qualidades na frente de quem foi escolher o curro, e até do proprio lavrador.

Na sociedade humana tambem se encontram individuos, que com as suas doces falas se sabem insinuar, para no momento psicologico enterrarem a choupa, mostrando a perversidade do seu coração.

O 8.º bicho foi mimoseado á saida da gaiola com um par de ferros que, com certesa, lhe fizeram bom estomago. Tinha bastante pé. Na altura desde boi os espectadores tambem tomaram muito pè a debandarem, porque se não o fizessem arriscavam-se a chegar a suas casas quando o seu jantar já estivesse frio, pois que a casa estava positivamente á cunha.

Resumindo diremos:

Artistas — muito bons.

Touros — satisfizeram.

In GAZETA DE ESPINHO, Espinho – 20 de Setembro de 1914