2 DE SETEMBRO DE 1908 - LISBOA: NA POESIA ESTÁ A VERDADE...



Biblioteca nacional de Portugal

Passes... de peito

Cá estou eu armado em acalmador!

O sr. Ferreira do Amaral foi quem acalmou o Zé Povinho, eu vou acalmar a D. Critica Taurina!

N'estas coisas o que é preciso é ser muito intelligente.

Mais que o Botas!

Mais que o Martins!...
Ora é isso justamente que eu sou; e por isso, vou vêr se consigo pôr todos de accordo.

Isto é, acalmados.

É para ahi uma balburdia com a tal historia dos touros para cavallo serem ou não tirados á sorte, que uma pessoa fica banzada!

A Verdade Taurina diz e diz muito bem:

Com o sorteio desapparece a responsabilidade.

As Bandarilhas de fogo dizem e tambem dizem muito bem:

Não pode implantar-se o sorteio dos touros para lide de cavallo... etc. etc.

E esta?

Uns querem sorteio, outros não querem sorteio.

Tal qual como em S. Bento.

Foi isto que me fez matutar um bocado, sobre a maneira de acalmar a situação, e pôr todos de accordo.

Na minha fórma de vêr, é preciso haver um sorteio, que não seja sorteio; a fim de contentar todos.

Pois encontrei eu!

Sinas!?

Na vespera das corridas, o Cezario que está sempre á porta da tendinha, pega na caixa das sinas e espera pelos artistas.

Chega o José Bento (de Araújo) por exemplo, zás, tira o papellinho e vae vêr a sua sina.

O cavalleiro que tirar esta sina será 
dotado de um caracter jovial e bondoso;
muito dado a viagens sobre as aguas
do mar e ás terras de Santa Cruz, de
onde lhe provirão bons lucros;
Terá uma enfermidade por causa da
carioca e viverá 80 annos.

Terás no touro primeiro
Um tunantão com malicia
E no segundo um matreiro
Mais sabido que um policia.


Que tal acham a minha idéa?


Fica o artista prevenido e é uma sorte sem ser tirada á sorte pelo tal sorteio!

Poderão não concordar,
Chamarem-me até casmurro,
Mas não me podem negar
ter talento como burro!

O amigo compositor, o numero passado, escangalhou-me o ultimo verso do reclamo ao Segurado e ao toureiro de tres pernas.

Em vez de descomposto, poz decomposto, o que era caso para o amigo Segurado se zangar commigo por eu annunciar um toureiro da Morgue; pois, por emquanto, que me conste, é o unico logar onde se exhibem a publico homens decompostos.

Ora pois... paciencia!

Sôr compositor,
Faça-me favor
De quando compôr,
Olhar p'ra o que faz;

É caso p'ra isso,
Pois creia, eu enguiço,
Estragando o serviço
De cá do rapaz!

O lenço da varina, como lhe fosse levantada a incommunicabilidade, recebe varios amigos na rua dos Fanqueiros.

ZÉ DA HERDADE

In O XUÃO, Lisboa - 2 de Setembro de 1908